Vítor Pereira

Conhecida popularmente como a “Sala de Visitas dos Açores”, Furnas é uma freguesia do concelho de Povoação, na ilha de São Miguel. O seu nome deve-se aos fenómenos vulcânicos ativos que se espalham por todo o vale, cuja principal riqueza está na grande variedade de nascentes de águas minerais e termais. São essas águas, quentes e férreas, que durante longos meses banham o inhame das Furnas, conferindo-lhe características únicas.

Originário do Sudeste Asiático, o inhame terá sido introduzido nos Açores durante o povoamento das ilhas. Nas Furnas, cultiva-se em lameiros junto às ribeiras de águas sulfurosas. Ricas em minerais, essas nascentes permitem o cultivo sem recurso a fertilizantes químicos ou pesticidas — ao contrário da cultura em solo seco. Diz-se que o inhame banhado nestas águas quentes é especialmente saboroso e amanteigado, fazendo parte do famoso cozido das Furnas e das premiadas queijadas de inhame. Atualmente, existem dois grandes produtores na freguesia — e alguns pequenos — sendo um deles a empresa Maria Medeiros. 

À frente desta empresa está Vítor Pereira, filho de Maria Medeiros — a mulher que deu nome ao negócio após a morte do marido. Conhecido entre amigos por “Vitalino”, Vítor assumiu o negócio há cerca de 10 anos, depois de um percurso profissional fora das Furnas. Depois de concluir o curso de Técnico de Informática, em 2010, Vítor integrou a Fundação para a Divulgação das Tecnologias de Informação (FPTI), onde deu formação e exerceu funções como técnico de informática, até à extinção da entidade pelo Governo em 2011. Seguiu-se uma fase como vendedor de peças automóvel, mas com a doença do pai, regressou às Furnas para dar continuidade ao legado da família.

“Captamos as águas das ribeiras e banhamos o inhame durante sete ou oito meses, dia e noite. Depois retiramos a água e a terra precisa secar para o inhame amadurecer. E para ficar amanteigado, tem de ficar pelo menos um ano na terra”, explica Vítor, sublinhando ainda que “antes de plantar, é necessário nivelar bem o terreno com sacho para a água correr livremente, sem obstáculos”. No decorrer do cultivo, é feita a monda manual — ou seja, a remoção das ervas daninhas. Embora se assemelhe à batata, o inhame exige muito mais tempo para se desenvolver, o que contribui para o seu preço mais elevado. Após a colheita, os tubérculos são raspados com faca para retirar a casca, lavados manualmente e, depois, deixados a secar por alguns dias.   

Com uma pessoa a tempo inteiro a dar apoio, Vítor trata de todo o processo de plantio, colheita e também das vendas da empresa Maria Medeiros. Para além de clientes por todo o arquipélago — incluindo frutarias e restaurantes em São Miguel — grande parte da produção é exportada para os Estados Unidos. “Vende-se muito cá, mas os picos de exportação são no Natal e na Páscoa. Há uma comunidade açoriana enorme lá e exportamos para que possam fazer pratos tradicionais, como o cozido à portuguesa”, afirma Vítor, acrescentando que, “não é muito conhecido no continente — muita gente só descobre quando vem aos Açores”. 

No verão, “Vitalino” expande o negócio com um quiosque junto às caldeiras do Vale das Furnas, onde a especialidade são as espigas de milho doce, vendidas desde meados de maio. Embora cultive um pouco de milho nas Furnas, compra cerca de 80 % do milho a terceiros, pois os solos húmidos não são ideais para essa cultura. 

Além da agricultura e dos negócios, Vítor ainda encontra tempo para se dedicar a uma paixão de infância: o karaté. Começou aos 11 anos e hoje é cinturão negro, árbitro de nível A e treinador na Associação de Karaté dos Açores. Juntamente com a irmã e o cunhado, é responsável pelo Clube Karaté Shotokan da Povoação. “Não consigo estar sempre presente, mas ajudo no que posso”, conclui, enquanto raspa mais um inhame.

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