Orlando Trindade

Orlando Trindade poderia simplesmente apresentar-se como “luthier” ou violeiro, mas prefere descrever a sua atividade como “construtor e restaurador de instrumentos de cordas”. Embora goste do termo violeiro, por ser o nome tradicional da profissão em português, a palavra caiu em desuso nas últimas décadas, dando lugar ao termo estrangeiro “luthier”. 

De origem francesa, a palavra “luthier” deriva de “luth”, que significa alaúde, um antigo instrumento de cordas. Como o próprio nome indica, o termo designava originalmente os artesãos que construíam instrumentos da família dos alaúdes. Nos séculos XVII e XVIII, com o declínio do alaúde, “luthier” passou a referir-se sobretudo aos construtores de violinos, que então ganhavam popularidade. Essa designação manteve-se ao longo do século XX, tanto em francês como em inglês. Com o tempo, a palavra “luthier” foi sendo adotada por muitas outras línguas, incluindo o português. Hoje em dia, num mercado cada vez mais globalizado, é quase inevitável que qualquer violeiro tenha de recorrer a esse termo estrangeiro para se apresentar profissionalmente — e Orlando Trindade não é exceção.

A história do termo “luthier” foi a primeira de muitas que Orlando nos contou enquanto preparava o tampo de uma guitarra portuguesa para ser envernizado. Natural de Caldas da Rainha, Orlando Trindade iniciou a sua ligação à música na adolescência, quando começou a aprender viola acústica na Benedita. Foi lá que completou o ensino secundário e conseguiu o primeiro emprego no mundo da música, trabalhando numa loja de instrumentos musicais.

Ávido colecionador de revistas como “Guitar Magazine” ou “Guitar Magazine for the Practicing Musician” — que traziam inúmeros artigos sobre manutenção e reparação de guitarras — Orlando viu ali uma oportunidade de aplicar os seus conhecimentos, montando uma pequena oficina dentro da loja onde trabalhava. Paralelamente, viveu algumas experiências como guitarrista em bandas de garagem, tocando guitarra elétrica.

Por volta de 1998, ainda na zona da Benedita, Orlando Trindade recebeu um convite para trabalhar na construção e reparação de guitarras elétricas. Colaborou durante cerca de cinco anos com um profissional desta área e, nesse tempo, foi conhecendo pessoas que despertaram o seu interesse por instrumentos acústicos, nomeadamente o músico e compositor Pedro Caldeira Cabral. Com o apoio deste músico de referência, Orlando construiu os seus primeiros instrumentos antigos, incluindo réplicas de violas do Renascimento. Paralelamente, começou também a integrar grupos dedicados à música medieval e renascentista — “bem antes da moda das Feiras Medievais”, como faz questão de sublinhar. A sua formação foi essencialmente autodidata, marcada por uma busca constante e apaixonada por conhecimento. Em 2003, surgiu a oportunidade de trabalhar com Fernando Meireles, um dos mais reputados construtores de guitarras portuguesas, na sua oficina de violaria em Coimbra. “Foi um dos meus mestres”, recorda Orlando Trindade. Enquanto se especializava na construção de guitarras e outros instrumentos tradicionais, continuava a aprofundar contactos no meio musical e a realizar serviços de reparação e afinação de violas na pequena oficina que montou em casa dos pais. Foi aí que, em 2005, deu início à sua atividade independente como violeiro, ou “luthier”. Mais tarde, instalou-se em Caldas da Rainha, onde manteve uma oficina durante cerca de dez anos. Há cerca de um ano, mudou-se para a aldeia de Mosteiros, a meio caminho entre Benedita e Caldas da Rainha, onde continua a exercer a sua arte.

Nesta pequena oficina, anexa à sua habitação e equipada com excelentes condições acústicas e elétricas, já se fez o restauro de duas guitarras que pertenceram a Carlos Paredes, compositor e mestre da guitarra portuguesa. A colaboração com o Museu Nacional da Música, iniciada em 2014, consolidou o seu nome como um dos grandes mestres da construção e restauro de instrumentos de corda em Portugal. Entre os muitos instrumentos antigos que restaurou para o Museu, destaca-se a tiorba “Buchenberg”: um alaúde barroco construído em 1608 por Matheus Buchenberg, renomado mestre alemão da época. Apenas seis exemplares das suas tiorbas são conhecidos em todo o mundo, o que torna este restauro particularmente emblemático. O restauro das guitarras de Carlos Paredes e da tiorba “Buchenberg”, entre tantos outros restauros e construções de instrumentos para músicos de referência, representa o reconhecimento de uma vida dedicada à música. “Sou um autodidata com formação e investigação”, resume Orlando Trindade, numa frase que reflete bem a sua incansável busca pelo aperfeiçoamento na arte de construir e restaurar instrumentos de corda.

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