Jorge Lindinho
A presença de oleiros nas Caldas da Rainha está documentada desde o século XV. Graças aos solos ricos em argila, a atividade cerâmica desenvolveu-se ao longo dos séculos, tornando-se parte essencial da cultura e da identidade da cidade. Seja por Rafael Bordalo Pinheiro, que ali fundou a Fábrica das Faianças Artísticas Bordallo Pinheiro em 1884, ou pela chamada “louça das Caldas”, com a sua técnica particular de vidrado, Caldas da Rainha tem na cerâmica um dos seus valores identitários. Hoje em dia, a cerâmica continua a ter um papel de destaque no concelho, refletido no elevado número de profissionais em atividade. Recentementeme, foi lançado o livro “Roteiro dos Ceramistas”, que reúne mais de uma centena de artistas distribuídos por 76 ateliers no concelho de Caldas da Rainha. Um desses artistas, que se apresenta como oleiro, é Jorge Lindinho, cuja olaria se encontra na Tornada, uma freguesia do concelho de Caldas da Rainha.
Na Olaria Lindinho, é possível assistir a todo o processo de produção e criação deste oleiro caldense, oriundo de uma família sem qualquer ligação à olaria. “Sou oleiro de formação, não sou de filiação”, afirma, com orgulho. O seu caminho na cerâmica começou em 1987, ao frequentar o primeiro curso de Olaria de Roda no Centro de Formação Profissional para a Indústria Cerâmica (CENCAL), nas Caldas da Rainha. Os mestres deste curso foram os irmãos, João e Armindo Reis, os últimos mestres oleiros das Caldas da Rainha. Quatro anos depois, Jorge Lindinho concluiu também o curso de Cerâmica Decorativa na mesma instituição. Desde então, tem vindo a aprofundar os seus conhecimentos através de várias formações complementares em vidração, pintura e raku. Hoje, as peças que cria são fruto de décadas de aprendizagem, aliadas a uma apurada sensibilidade artística.
Antes de abrir a sua olaria, Jorge Lindinho passou por várias fábricas de cerâmica da região, como a Secla, a Molde Faianças e a Faianças Subtil. A vontade de ter um espaço próprio acompanhava-o há anos, até que, em junho de 2016, concretizou esse desejo ao fundar a Olaria Lindinho num espaço familiar. Dois anos depois, em 2018, o seu projeto foi reconhecido oficialmente como Unidade Produtiva Artesanal pelo IEFP, reforçando o valor e autenticidade do seu trabalho.
“Aqui faço todo o ciclo até ao produto final”, explica o oleiro, passando a descrever o processo de produção. “A origem de qualquer peça é a roda de oleiro. Depois, a peça vai a secar até atingir o ponto ideal, que permite avançar para as fases seguintes: a modelação e o acabamento. Antes de enfornar, retifico cada uma das peças, pois todas tem o seu ponto fraco. Quando saem do forno, passo a lixa nas peças para remover a quina viva, que se torna cortante com a aplicação do vidrado. Em seguida, sopro cada peça para remover o pó e passo à fase da vidração e decoração. Por fim, voltam ao forno para a segunda cozedura e, depois de arrefecerem, retifico novamente”, conclui, enquanto molda um vaso que, subitamente, se transforma num peixe.
Os peixes de Jorge Lindinho, sempre sorridentes e de olhos arregalados, são uma das suas imagens de marca. São também uma das muitas peças zoomórficas que cria em barro vermelho, onde se incluem “mochos, polvos, galinhas, sapos, raias, andorinhas, entre outros animais estilizados”. Outra característica marcante do seu trabalho são as cores vibrantes, resultantes de um processo que o próprio define como uma “desmultiplicação das cores”, que ocorre durante a vidração. “O tipo de peças que faço não tem a ver com a olaria tradicional”, explica Jorge Lindinho, que prefere dar primazia ao lado decorativo em detrimento do utilitário. “De certa forma, as minhas peças também têm alguma utilidade, e se considerarmos a decoração uma utilidade…”, sugere, deixando no ar a ideia de que a arte deve ser uma necessidade, não um luxo. Independentemente da função prática, Jorge sabe que já construiu uma identidade própria. “Quem conhece os meus trabalhos, já os associa à Olaria Lindinho”, afirma. Em pouco mais de meia dúzia de anos, criou um conjunto de peças com uma marca distintiva — reflexo do seu percurso, da sua visão e da sua criatividade.
Apesar de ter uma capacidade de produção limitada, a Olaria Lindinho conta com clientes espalhados por todo o país, sobretudo lojas de artesanato. Mesmo com a aquisição recente de um novo forno, mais pequeno que o primeiro, o volume de produção continua a não permitir “praticar preços de mercado para competir com quem tem grandes fornos”, admite Jorge Lindinho. Ainda assim, o oleiro não se mostra preocupado. O facto de ter outra ocupação profissional permite-lhe trabalhar na olaria sem a pressão de garantir o sustento da família. “Posso fazer o que gosto, sem stress”, afirma, valorizando a liberdade criativa que isso lhe proporciona.
Membro ativo da Associação de Artesãos de Caldas da Rainha, Jorge Lindinho participa regularmente na FIA Lisboa — a maior feira internacional de artesanato da Península Ibérica — e é frequentemente convidado a fazer demonstrações de roda de oleiro em escolas do concelho. Além disso, recebe com frequência a visita dos alunos da Escola Básica da Tornada no seu atelier.
Quem visitar a Olaria Lindinho, no número 64 da Estrada Nacional 8, em Tornada, Caldas da Rainha, será certamente bem recebido, e terá a oportunidade de conhecer o trabalho de um artesão que faz aquilo que lhe “vai na alma”.